Mostra Terra em cena e na Tela ocupa a Universidade
A disciplina de Projeto
Experimental em Teatro I ocorreu em conjunto com a 7ª Mostra Terra em Cena e na
Tela, que aconteceu entre os dias 26 e 29 de Dezembro de 2025 na Faculdade UNB
de Planaltina. A disciplina foi pensada para possibilitar nossa participação no
evento construindo a mística de abertura e assistindo às peças, filmes, debates
e oficinas. A Mostra Terra em Cena e na Tela é um evento organizado pelo grupo
de pesquisa Terra em Cena e reúne grupos de teatro, professores, pesquisadores
e estudantes de vários locais do Brasil para apresentar experiências
pedagógicas, peças e oficinas de Artes Cênicas e Audiovisual.
Na noite do dia 26, a abertura da Mostra aconteceu com a lavagem da Faculdade UNB de Planaltina e o 2º Sarau da LEdoC, no restaurante universitário, e contou com apresentações musicais e poemas recitados pelos estudantes da Licenciatura em Educação do Campo da UNB. O estudante da LEdoC Tainã Malta, apresentou um desfile com as roupas que ele desenhou, costurou e pintou, e as estudantes da LEdoC foram as modelos das roupas reafirmando nosso espaço e celebrando a cultura quilombola. Também foi apresentada uma cena de teatro muito forte do grupo Cenas Emendadas, que retratava situações de violência contra a mulher em um relacionamento abusivo que evoluiu para uma cena pesada de feminicídio. O grupo de afoxé Omó Ayó encerrou o dia com muito amor nas mensagens, dança e ancestralidade.
No dia 27 e 28
aconteceram as oficinas de argila corpo e território, cineclube popular,
muralismo na restauração de um mural que foi apagado durante uma reforma na
Universidade, e iluminação e o trabalho da luz na cena. As duas manhãs de
oficinas permitiram a construção de materiais, formações e vivências em
diferentes áreas.
As mesas de debates ocorreram na tarde do dia 27 com os temas agroecologia e cultura, e conjuntura e estratégias dos movimentos sociais. Após as mesas o Coletivo Fuzuê apresentou a peça “Toró, ode à natureza ou quando ou crime acontece como a chuva que cai.” Que inspirado em fatos reais, traz questionamentos e contradições do desastre climático, sistemas de violência. Fechando a programação do dia, ocorreu a mostra audiovisual com uma seleção de curtas e longas criados dentro da rede Terra em Cena.
Iniciando a programação
do dia 28, o grupo Encena Kalunga, criado por estudantes da LEdoC, apresentou a
peça “Padrão”, uma peça de teatro fórum, que mostrou diversas opressões dentro
do contexto de uma escola militarizada. A cena e o debate atravessou temas como
a reprodução sistêmica do racismo mesmo inconscientemente, soluções como a
organização e registro das violências como provas e a importância de uma rede
de apoio na superação de situações de opressão. Depois, a mesa de devolutivas
de pesquisas de pós-doutorado e de doutorado em andamento, mostrou experiências
concretas de práticas pedagógicas e pesquisas contra hegemônicas. A mesa foi
composta pelas professoras Ofelia Ortega, Carina Guimarães Moreira, Keyla
Morales, Dhenise Galvão, Fernanda Rosas, Simone Menezes e o professor Felipe
Canova.
Após a mesa, o grupo de São Paulo, Estudo de Cena, apresentou a peça “Plataforma, um experimento teatral.” Com um cenário muito inteligente, prático e futurista. Duas atrizes viajam em décadas diferentes, passando por diversas revoluções lideradas por mulheres da classe trabalhadora e construindo situações, diálogos e realidades a partir de fotos, que vão desde 1895, com o primeiro filme da história, que retrata “Operárias saindo da fábrica.” A fábrica é dos irmãos Lumière e o filme foi gravado por eles, o patrão filmando as trabalhadoras, que saem apressadas dos turnos exaustivos. A trama viaja no tempo e no espaço de forma épica, trazendo movimentos sincronizados, a fala curta e a troca sincronizada da atenção que é dividida entre as atrizes numa espécie de ritmo que me lembrou uma linha de produção da revolução industrial, juntamente com os sons e movimentos repetidos. A sonoplastia nos bombardeia com sons de notificações de aplicativos, que se misturam com vozes como rádio e tv, causando um desconforto, um super estímulo, que se compara com a experiência dentro da internet e nas redes sociais. A peça fala sobre desumanização e uberização do trabalho, a escala exaustiva de trabalho e relações de trabalho na perspectiva feminina, mostrando experiências reais que deram certo na história, liderados por mulheres, quase que um coro convidando para a organização e mobilização coletiva por melhores condições e realidades de trabalho. De forma engraçada e inteligente somos bombardeados de informações que nos fazem refletir o hoje e o futuro do trabalho.
No último dia da Mostra
ocorreu a exposição dos banners das escolas do campo, criando um espaço de
troca, de experiências pedagógicas nessas escolas de diversas regiões,
construindo uma teia de conhecimentos e vivências. Também aconteceu a mesa “A
escola do campo como centro popular de cultura.” Com as professoras Simone
Soares, Clarice Santos, Eliene Novaes, Viviane Pinto e o professor Felipe
Canova. Encerrando o evento, a Cia Burlesca apresentou a peça “Aurora” baseada na
campanha “Sim eu posso” que erradicou o analfabetismo em Cuba, reafirmando o
papel da educação como prática libertadora sendo fundamental na organização
coletiva para a transformação social.
Imagem 1 (Abertura da Mostra e Sarau
- 26/11/2025)
Imagem 2 (Oficina de cerâmica -
27/11/2025)
Imagem 3 (Peça “Padrão”, grupo Encena Kalunga - 28/11/2025) Fonte: Arquivo pessoal
Imagem 4 (Peça “Plataforma”, grupo Estudo de Cena -28/11/2025) Fonte: Arquivo pessoal
Aimê Fernandes Monteiro
Ser estudante da Licenciatura em Educação do
Campo (LEdoC) é viver muito mais do que um simples percurso acadêmico é
atravessar processos formativos que transformam a pessoa, o corpo, a leitura de
mundo, a relação com o coletivo e o entendimento do papel político da educação.
É amadurecer, crescer e se redescobrir em comunidade.
Quando entrei na LEdoC, anos atrás, eu não
imaginava o quanto essa experiência modificaria minha forma de ser e de estar
no mundo. Se alguém me perguntasse, naquele início, se eu gostaria de
apresentar uma mística, eu responderia prontamente que não. Eu não me sentia
preparada. Meu corpo tremia só de pensar em falar diante de outras pessoas. Eu
não tinha domínio da fala, nem confiança, nem coragem para ocupar o espaço que
hoje ocupo.
Porém, quase quatro anos depois, olho para trás
e vejo que já não sou mais a mesma. A LEdoC me atravessou de um jeito que
nenhuma outra formação seria capaz. A mística, que antes me causava temor, hoje
se apresenta como uma forma mais suave e transformadoras que vivenciei. Ela não
é apenas uma apresentação artística, nem um simples ritual de abertura é um
método pedagógico vivo, sensível, político e profundamente humano. Ele nos
ensina a aprender com o corpo, com a coletividade, com as emoções, com a
ancestralidade e com os símbolos que trazemos da vida.
Na disciplina de Teatro, compreendi de forma
ainda mais concreta como a mística pode ser um instrumento de formação crítica.
A nossa mística foi construída como um verdadeiro debate político, trazendo
temas urgentes para o centro da discussão. Elaboramos uma apresentação que
dialogava diretamente com as vivências cotidianas, com símbolos carregados de
sentido e com aquilo que atravessa a realidade das pessoas que constroem a
educação do campo.
Cada objeto utilizado tinha significado; cada
gesto representava uma dor, um questionamento, uma memória ou uma resistência.
Parte da apresentação envolveu leituras de jornais das últimas vivências,
trazendo para o palco temas que estavam em pauta no país como a a repercussão
da prisão de Bolsonaro, a segunda macha nacional das mulheres, as discussões
ambientais e políticas em torno da COP30, além de reflexões sobre como esses
acontecimentos atravessam o campo, a educação, as comunidades rurais.
Essa construção deixou evidente que a mística
não é apenas um momento de distração ela
é um ato pedagógico de resistência, de consciência política, de formação
crítica e de fortalecimento coletivo. Ao mesmo tempo em que exige entrega
emocional, nos ensina que aprender não se limita ao racional aprender é também sentir, elaborar,
representar, simbolizar, denunciar e anunciar.
Ao atravessar essa formação, tornei-me uma
mulher que estar aprendendo a não tem medo. Não ter medo de apresentar uma
mística, de falar diante de uma sala cheia, de atuar em uma peça de teatro ou
de expressar posicionamentos políticos quando necessário. O teatro na LEDOC não
transforma apenas a técnica; ele transforma a pessoa por completo. Ele nos
desloca, nos desafia, nos provoca e nos prepara para ocupar espaços que antes
pareciam impossíveis.
Na minha turma, Lélia Gonzalez, vejo claramente
como esses processos impactam cada estudante. O crescimento político,
psicológico, emocional e social ficou ainda mais evidente durante a sétima
Mostra Terra em Cena. Ao longo daquela semana, me permiti observar o percurso
de cada colega. Percebi olhares diferentes, posturas mais seguras, discursos
mais firmes e corpos que aprenderam a se expressar com significado.
Cada mística, cada cena de teatro, cada debate e
cada símbolo revelava transformações que, por vezes, só são perceptíveis quando
paramos para olhar com cuidado. E, naquele momento, compreendi uma das maiores
lições da LEdoC: ninguém se forma sozinho. Nós nos formamos no encontro com o
outro. Nós nos formamos um com o outro.
As experiências no audiovisual ma disciplina
Experimento em audiovisual produção e finalização. também foram marcantes e
ampliaram a minha compreensão sobre linguagem, crítica social e expressão criativa.
Nas aulas do professor Felipe Canova, trabalhamos filmagens centradas em temáticas
sobre moralidades da LEdoC, explorando como as narrativas se constroem a partir
de vivências reais, do território, do campo e das relações que estabelecemos
dentro e fora da universidade. Foi um exercício de observação, sensibilidade e
análise política, porque filmar não é apenas registrar é interpretar, escolher
o que mostrar, o que silenciar, o que enfatizar e o que denunciar.
Além disso, as oficinas oferecidas durante as
vivências intensivas demonstraram o quanto a LEdoC é inclusiva e aberta à
diversidade de saberes. As oficinas de barro, audiovisual e cerâmica
proporcionaram momentos de descanso mental, lazer e expressão artística. Elas
nos lembraram que o processo educativo também passa pelo fazer com as mãos,
pelo toque, pelo silêncio, pela criação coletiva e pela ludicidade.
Uma das experiências mais simbólicas foi a
oficina de muralismo, que possibilitou a restauração de um painel que havia
sido apagado pela própria faculdade. Esse gesto se tornou um marco ao
repintarmos o mural, afirmávamos que nossas memórias, lutas e existências não
serão apagadas. Podem tentar apagar nossa história, mas não conseguirão. Onde
houver apagamento, haverá reconstrução. Onde houver silêncio imposto, haverá
voz. Onde houver tentativa de invisibilização, haverá reafirmação.
Durante toda essa trajetória, percebo que a
formação na LEdoC é integral. Ela toca a mente, o corpo, as emoções, a política
e a coletividade. É uma formação que não separa teoria e prática, razão e
sentimento, indivíduo e comunidade. É um espaço onde aprendemos com o outro,
para o outro e pelo outro. Um lugar onde cada pessoa carrega consigo uma parte
do processo coletivo.
Estar na LEdoC é aprender que educação é luta, é
memória, é resistência e é afeto. É acreditar que um projeto de país mais justo
começa pela valorização dos povos do campo, de suas histórias e de seus modos
de vida. É reconhecer que o conhecimento se faz no território, na experiência e
no encontro.
Aimê
filmando a 7º Mostra em tarefa da disciplina Processo experimental em
audiovisual 1. Foto: Adonai.
Reconstrução
do painel apagado na reforma do alojamento, em oficina de Muralismo com os
professores Felipe e Ofélia. Foto: Aimê Fernandes
Mística da 7ª Mostra Terra em Cena e na Tela. Foto: Rafael Villas Bôas
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