Certa feita ouvi um dos companheiros da Rede Nuestra America, Douglas Estevam, que também é integrante da Brigada Nacional de Teatro do MST Patativa do Assaré, falar que a Mística para o MST não se restringe a um momento. É um termo que se aplica às formas de socialização que congregam os espaços, a cultura que se estabelece. Citou alguns exemplos: “Dizemos que um determinado assentamento tem uma mística assim, pela maneira como recebe as pessoas, como os espaços estão dispostos (...)”.
Nesse sentido a Mística seria um também um termo relacional.
Além de uma ação, ao talvez, pelo conjunto dessas ações forma uma Mística que
dá o tom das organizações.
Estou rememorando essa fala desde dia 10 de junho de 2025, em
que o MST convidou a Universidade de Brasília (UnB) e o Instituto Federal de
Brasília (IFB), parceiros na luta pela reforma agrária, para conhecer a nova
sede do escritório nacional em Brasília.
Localizado no espaço central do Distrito Federal o escritório
rompe com a ideia formal de um espaço frio, burocrático e, até mesmo, asséptico
do ponto de vista estético. Este seria a ideia geral que me vem à mente quando
penso em um escritório. O que conheci no tour
pelo escritório do MST foram, além de salas de recepção, reuniões e
projetos, um espaço que conta também com uma sala de convivência, mas não
confunda com a lógica neoliberal em que a ideia de salas desse tipo para
trabalhadores é recheada de jogos para lubridiar as horas de trabalho alienadas
e aumentar a produtividade. O que vemos ali é um espaço que tanto possibilita
um descanso para os/as trabalhadores/as que ali estão, como pode, por exemplo,
receber os filhos/as destes trabalhadores/as, como foi o caso de ontem,
considerando a Greve dos Professores que acontece, em paralelo, neste momento,
nas escolas do Distrito Federal.
Não para por aí. O novo espaço também organizou uma cozinha e
um refeitório. Nada mais coerente, penso eu. Um movimento social que luta pela
soberania alimentar garante a seus/suas trabalhadores/as um alimento limpo de
venenos e ultra processados. Para além disso, garantir a possibilidade da comensalidade
é sem dúvida o primeiro passo para gente se organizar. Não à toa, fomos
convidas/os para um... Café com o MST. A recepção que o movimento nos oferece é
antes de tudo uma mesa farta, além de, claro, sorrisos e abraços.
O clima amistoso segue com a Mística, formalmente dita. Não
causa estranhamento que quem puxa a cantoria com palmas e violão é um dos
advogados do MST. A gravata não inibe o companheiro de cantar e tocar. E aqui
preciso falar que eu, que venho do chão de escola pública, mesmo não sendo uma militante
orgânica do Movimento já me sinto à vontade naquele espaço. Para mim era como
se estivesse na minha escola e não em um escritório.
A companheira que coordenou a reunião não só nos brindou com
sorrisos como declamou poesia no entremeio da explanação das pautas. Mas
alerta: “O café não é à toa, nós estamos aqui para dividir tarefas também”. E
em seguida alivia: “Mas nada que o sujeito coletivo não dê conta”. E a palavra
corre aberta entre a plenária composta por dois ex-reitores, professores/as da
UnB e IFB, militantes do Movimento, estudantes da Universidade, ADUnB e a atual
reitora da UnB.
O que fica latente nas falas é que a articulação entre MST e
UnB é uma construção longeva que gera frutos, inflexiona movimentos em direção
à luta por justiça social e que pode incidir ainda mais, mesmo com a conjuntura
desafiadora e que impõe a emergência da organização da classe trabalhadora, a
partir de movimentos internacionalizados, como o da tarde de ontem.
No plano de fundo das
pautas objetivas, o que encontros como o de ontem coloca é a dimensão de outra
cultura política, onde o trabalho e a alegria coexistem na medida em que as
tarefas, por mais que sejam complexas, não são esvaziadas de sentido político e
social. É a dimensão do trabalho não alienado que a Mística, no sentido mais
integral, parece se fazer no escritório nacional do MST, no Distrito Federal.
Simone Rosa
12 de junho de 2025
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